domingo, 20 de abril de 2014

PREGAÇÃO NA PÁSCOA: O QUE NÃO SE DEVE DIZER!





1- NÃO DIGA: "JESUS MORREU AOS 33 ANOS DE IDADE".
"A afirmação comum parece razoável, pois se Jesus “começou seu ministério”, quando tinha cerca de “trinta anos de idade” [Lc 3;23], se envolveu por três anos neste ministério, e uma vez  que João  em seu evangelho menciona três Páscoas, praticamente eliminando a possibilidade de uma quarta, então Jesus tinha 33 anos quando morreu."
 No entanto, praticamente nenhum estudioso é capaz de acreditar de verdade que Jesus tinha 33 anos quando foi crucificado.
      Jesus nasceu antes de Herodes, o Grande emitir o decreto de execução de todas as crianças do sexo masculino que tivessem dois anos de idade ou um pouco menos, [Mt 2,16...] e que estivessem residindo na região de Belém de Judá. Se Herodes morreu na primavera de 4 aC, então Jesus nasceu no outono de 6 aC, e ao nos lembrarmos que não se conta o “ano 0” entre o aC e dC, então Jesus teria 37 ou 38 anos por ocasião de sua morte, na primavera de 33 dC. Esta é a possibilidade que se acredita ser a mais provável.
 E, mesmo se considerarmos que Jesus tenha morrido no ano 30 dC (a única data alternativa séria) Ele teria 34 ou 35 anos e não 33.
Nenhuma grande doutrina é afetada por esse equívoco comum, mas não devemos colocar em risco sua credibilidade ou confiança proclamando no púlpito fatos que não são verdadeiros. 

2- NÃO TENTE EXPLICAR A APARENTE AUSÊNCIA DO CORDEIRO NA ÚLTIMA PÁSCOA APENA DIZENDO QUE JESUS É O CORDEIRO PASCAL.
Embora seja gloriosamente verdade que Jesus é " o cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo" [João 1:29], isso não significa que não havia na Ceia do Senhor um cordeiro pascal em carne e osso.
Na verdade, certamente o cordeiro estava lá: " Então chegou o dia dos pães ázimos, em que o cordeiro da páscoa seria sacrificado. então Jesus enviou Pedro e João e disse-lhes: 'Ide preparar a Páscoa, para que a comamos' [Lucas 22,7 e 8] Mesmo que nos relatos dos Evangelhos não esteja especificamente mencionado, o ato de comer o cordeiro pascal era uma das partes mais importantes da Páscoa judaica [Êxodo, 12.3]. É por isso que os discípulos juntos, e em grupo comeram a refeição à noite dentro dos portões da cidade, onde a mesma era consumida acompanhada de vinho tinto, antes do partir do pão e de cantar um hino. 
Como não há desacordo sobre a natureza da Ceia Pascal fica claro que Jesus celebrou a Páscoa com os Doze, na noite antes da crucificação, porém não se pode esquecer que Ele pela tradição se viu como o "cordeiro sacrificial" que derramou o sangue, pelo qual  Deus deu a seu povo um poderoso livramento, ao  libertá-los da escravidão no Egito.

3 - NÃO DIGA: A MESMA MULTIDÃO QUE ADOROU JESUS NO DOMINGO DE    RAMOS FOI A MESMA QUE GRITOU PELA SUA CRUCIFICAÇÃO NA SEXTA FEIRA.
Este tipo de declaração, logicamente se constitui em um poderoso gancho de um sermão para ilustrar a inconstância do coração humano em relação a Jesus, o Messias, porém duas observações não podem deixar de serem feitas: 
Primeira - Não está inteiramente claro que a multidão que exclamou Hosana durante a entrada triunfal de Jesus em Jerusalém seja o mesmo grupo de pessoas da multidão que gritou "crucifica-o", diante de Pôncio Pilatos. O primeiro grupo parece ser formado principalmente por peregrinos e por seus discípulos, enquanto o segundo grupo parece ser de pessoas habitantes de Jerusalém.
Segunda: As duas multidões expressaram sentimentos (paixões) alicerçados na falta de entendimento correto das  Escrituras.
Quando Jesus entrou em Jerusalém montado em um jumento, o entusiasmo daqueles que proclamaram: HOSANA foi baseado na concepção errônea nacionalista do Messias. E quando agitada pelos líderes judeus que falsamente acusaram Jesus de blasfêmia perante Pilatos, o grito de CRUCIFICA-O, também foi baseado em um equívoco sobre a identidade do Messias. 
O elo comum entre as duas multidões não foi a inconstância do coração humano, mas a falta de conhecimento e aceitação do Messias como o humilde Servo Sofredor.

4 - NÃO IGNORE O PAPEL DAS MULHERES COMO TESTEMUNHAS DO CRISTO RESSUSCITADO.
O número e identidade das mulheres nos relatos da ressurreição pode ser de difícil explicação, o que é uma das razões pelas quais é fornecido um glossário para nos guiar sobre  os últimos dias de Jesus. Uma dos exemplos confusos é que nada menos do que quatro mulheres compartilham o nome de Maria:
1- Maria Madalena; 2 - Maria, mãe de Jesus; 3 - Maria, mãe de Tiago e de José; 4 - Maria, mulher de Cléofas (talvez o irmão de José de Nazaré). Além delas há Joana, cujo marido, Cuza, era funcionário de do governo de Herodes Antipas; e Salomé, provavelmente mãe dos apóstolos Tiago e João.
Portanto, quando fizer uma pregação na Páscoa não ignore o testemunho destas mulheres considerando-os como detalhe secundário. 
No primeiro século as mulheres não eram ainda elegíveis para testemunhar em um tribunal judaico, inclusive Josefo, o maior  historiador judeu dizia que mesmo que o testemunho fosse dado por várias mulheres não seria "aceitável por causa da leviandade e ousadia do seu sexo". Celso, um crítico do cristianismo do século II zombou de Maria Madalena como suposta testemunha da ressurreição, se referindo a ela como uma "histérica fêmea... iludida por feitiçaria" . 
Esse pano de fundo é importante e aponta para 2 verdades cruciais:  
1ª - é um lembrete teológico de que o reino do Messias transforma a  mente das pessoas em relação  ao sistema do mundo, pois Jesus naquele tipo de cultura totalmente contrário afirmou radicalmente a plena dignidade das mulheres e o valor vital de seus testemunhos. 
2ª - é um poderoso lembrete para se crer na precisão dos relatos da ressurreição, pois se fossem "mitos habilmente inventados", as mulheres nunca teriam sido apresentadas como as primeiras testemunhas oculares do Cristo ressuscitado. 

5 - NÃO SE CONCENTRE SOBRE O SOFRIMENTO DE JESUS PARA QUE NA   MESMA MEDIDA VENHA A NEGLIGENCIAR A GLÓRIA DA CRUZ ATRAVÉS   DA, E NA, RESSURREIÇÃO.
Certas tradições cristãs tendem a se concentrar quase que unilateralmente sobre o sofrimento de Jesus na cruz, sobre a incrível dor que Ele teve de suportar, na sua humilhação e separação de Deus. Isto pode ser visto nas representações teatrais e cinematográficas como no filme a Paixão de Cristo de Mel Gibson, na reconstituição que a  igreja Romana faz do caminho percorrido até o local da crucificação, [Via Dolorosa e estações para a Cruz], e em muitos sermões que  sempre ouvimos nas igrejas Evangélicas , e porque não mencionar, até em muitos de nossos hinos favoritos.    
 É notório  que os quatro Evangelhos, especialmente Mateus, Marcos e Lucas são concordantes em mostrar que Jesus sofreu e muito por nós, de como Ele deu sua vida pela nossa Salvação, de como o nosso pecado foi perdoado e justificado, mas, no entanto há outro aspecto da história da Páscoa, talvez o melhor, o que está contido na declaração de João de que Jesus "sabia que era chegada a sua hora de sair deste mundo e ir para o Pai, e havendo amado os seus que estavam no mundo... amou-os até o fim". [João 13,1]. Ao introduzir não só a cena do lava-pés, mas todo o relato da paixão, João escreveu o seguinte: "Jesus sabendo que o Pai  lhe entregara nas mãos, e que Ele viera de Deus e estava voltando para Deus, levantou-se da ceia..." [13: 3 - 4, cf 14:28]
Em outras palavras: João se esforça para mostrar que a Cruz não era um beco sem saída, mas uma estação do caminho de Jesus em sua volta para casa, em sua volta para o Pai!
É por isso que João usa como destaque uma nota triunfante no início da narrativa da crucificação: " O Pai entregara tudo nas mãos de Jesus, e Jesus estava em seu caminho de volta para a glória pré-existente, que Ele gozava com o Pai. [17:5,24].
É como o escritor de Hebreus diz: "pela alegria que lhe estava proposta é que Jesus suportou a cruz, desprezando a ignomínia" [12,2].
                                    
Nesta Páscoa vamos nos esforçar para não deixar de fora a parte da GLÓRIA ao contarmos a história do sofrimento de Jesus. Sem dúvida, Jesus na cruz foi perfeito ao demonstrar, sua obediência, o amor de Deus pela humanidade, e a oferta do Deus-homem como substituto na expiação do pecado. A obra terrena de Jesus é um fato consumado [ João 19.30], mas a sua gloriosa obra de governar, reinar e interceder continua até hoje.




PUBLICAÇÃO ORIGINAL:
http://www.christianitytoday.com/ct/2014/april-web-only/five-errors-to-drop-from-your-easter-sermon.html

Traduzido por Fabio S. Faria

Andreas Köstenberger é professor e pesquisador sênior do Novo Testamento e Teologia Bíblica na Southeastern Baptist Theological Seminary em Wake Forest, Carolina do Norte. 
Justin Taylor é vice-presidente e editor sênior de livros em Crossway. 
Eles são co-autores de "Os últimos dias de Jesus: A semana mais importante a pessoa mais importante que já existiu" !

  
   

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terça-feira, 15 de abril de 2014

CALVINO X O CALVINISMO DE SEUS SUCESSORES.

       
 

           "É QUASE NORMAL QUE NA HISTÓRIA, PERÍODOS DE GRANDE CRIATIVIDADE SEJAM SUCEDIDOS POR UM TEMPO DE PARALISAÇÃO DO PENSAMENTO.
 A REFORMA INICIADA POR LUTERO, ZUÍNGLIOE CALVINO NÃO FOI EXCEÇÃO. TALVEZ NO DESEJO DE PRESERVAR A VISÃO DESTES HOMENS, SEUS SUCESSORES NO PERÍODO QUE SE SEGUIU, ACHARAM POR BEM PROMOVER DE FORMA EXCESSIVA O CRESCIMENTO DE UMA ABORDAGEM  ESCOLÁSTICA."
                       Entre os seguidores de Calvino, a grande preocupação foi com a questão do método, ou seja, com a ordenação sistemática e a dedução coerente das idéias. Os teólogos sucessores de Calvino foram levados à uma posição em que tinham de defender suas idéias frente a opositores tanto luteranos quanto católicos.
                          A filosofia de Aristóteles que havia sido encarada com certa reserva por Calvino, se constituiu em grande aliada. Vários de seus seguidores recorreram aos ensinos filosóficos de Aristóteles, na esperança de que estudos sobre MÉTODO, desenvolvidos por ele oferecessem alguma ideia onde a teologia calvinista tivesse a condição de se apoiar sobre um alicerce racional mais sólido.
         Esta nova abordagem teológica teve como resultado quatro características distintas:
1- A razão recebeu um papel no estudo e na defesa da teologia cristã.
2- A teologia passou a ter como ponto de partida seus primeiros princípios, e prosseguia na dedução de suas doutrinas, fundamentando nesses princípios.
3- A teologia foi entendida como algo que se baseava na filosofia aristotélica, e particularmente nas perspectivas de Aristóteles em relação à natureza do MÉTODO, e isto levou vários autores reformados posteriores a serem vistos, melhor na posição de teólogos estudiosos da filosofia do que da Bíblia.
4- A teologia voltou-se para as questões metafísicas especulativas, de forma  especial para as relativas à natureza de Deus, à sua vontade, tanto  para  humanidade quanto para a criação, e sobretudo para a doutrina da  Predestinação.
                  Essas características fizeram com que o ponto de partida da teologia passasse a ser os "princípios gerais", e não um acontecimento histórico específico. Enquanto para Calvino, a teologia se concentrava e se derivava de um só evento - JESUS CRISTO - tal como está registrado nas Escrituras, para   seus seguidores posteriores, os princípios gerais ocuparam a posição central.
Foi nesta época, onde a preocupação com as questões metodológicas atingiu altos níveis, que surgiu um notável escritor chamado Teodoro de Beza. 
                     Beza além de se tornar genro de Calvino, também o sucedeu na direção da academia de Genebra. 
Os estudiosos interpretam seu trabalho de maneiras diversas, ou seja, enquanto uns opinam que ele causou a distorção e o enrijecimento da teologia calvinista, outros entendem que ele contribuiu para a explicitação e aperfeiçoamento do pensamento de Calvino. 
                            De 1570 a 1582 Beza escreveu os três volumes de sua obra mais importante:TRATADOS TEOLÓGICOS.
      Nesta obra apresentou uma descrição racionalmente coerente dos principais elementos da teologia reformada mediante o uso da lógica aristotélica.  
                                      Ao contrário de Calvino, que se concentrava em um fato histórico específico:JESUS CRISTO, para depois prosseguir na investigação de suas implicações, ou seja, uma abordagem ANALÍTICA E INDUTIVA, Beza partiu de princípios gerais e prosseguiu na dedução de suas consequências para a teologia cristã, ou seja, em uma abordagem SINTÉTICA E DEDUTIVA.
Os princípios gerais que Teodoro de Beza utilizou como ponto de partida para sua sistematização teológica foi os DECRETOS DIVINOS DA ELEIÇÃO, - isto é na decisão de Deus em eleger certas pessoas para a salvação, e outras para a condenação -, fazendo com que sua teologia se dedicasse à investigação das consequências dessa decisão. Assim a doutrina da Predestinação assumiu a posição de um princípio determinante e teve como principal consequência a "doutrina da reconciliação limitada, ou da redenção particular". 
O uso dos "decretos divinos da eleição", como base para o sistema teológico fêz surgir nos círculos reformados uma importante controvérsia com respeito à sequencia lógica destes decretos. "Controvérsia que gerou um debate ao qual, alguns teólogos se referem como sendo algo notoriamente pedante, e que se transformou no símbolo do obscurantismo teológico."
 O ponto inicial do entendimento desta controvérsia está situado no ensino de Calvino sobre a "doutrina da predestinação". Ele havia situado esta doutrina dentro da soteriologia, como parte da atividade graciosa de Deus, e admitiu tratar-se de uma área difícil, delicada e misteriosa. Já Teodoro de Beza deu a esta doutrina uma ênfase maior, situando-a no escopo da doutrina de Deus, e desta forma se aproximou mais de Zuínglio que de Calvino.
 No intuito de proteger a doutrina da predestinação da possibilidade de se tornar um "sinergismo, Beza e alguns teólogos ortodoxos desenvolveram uma posição que considera o decreto da "eleição" anterior ao da "queda", ou seja, a humanidade antes da "queda" é considerada o objeto do "decreto divino da predestinação", e assim a "queda" é vista como meio de levar a cabo o "decreto da eleição". Nesta posição à qual se deu o nome de SUPRALAPSARISMO, a ordem dos decretos é:
1- decreto de predestinar alguns para a salvação; 2- decreto de criar o mundo; 3- decreto de permitir a queda; 4- decreto de prover os meios de salvação; 5- decreto de aplicar a salvação dos eleitos.
                       Note-se que nesta corrente o decreto da predestinação é o mais fundamental, antecedendo todos os demais, em especial o de permitir a queda. Nela o propósito de Deus é glorificar a si mesmo pela predestinação, e o decreto se aplica aos homens considerando-os como criaturas. 
              Em oposição, alguns anos depois, outros teólogos do circulo reformado elaboraram outra posição a qual deram o nome de INFRALAPSARISMO, ou seja, o entendimento de que a eleição pressupõe queda da humanidade. 
Dessa forma os "decretos da eleição", voltam-se para toda a humanidade como uma "massa de pecados", ou seja, a decisão de Deus predestinar alguns para a eleição e outros para a condenação é uma reação à "queda". Os seres humanos caídos são o objeto desta decisão. 
No INFRALAPSARISMO a ordem dos decretos é:
1- criar o mundo e os seres humanos; 2- permitir a queda; 3- predestinar para a perdição ou perdição; 4- prover meios para a salvação; 5- aplicar a salvação aos eleitos. 
Nesta corrente o propósito de Deus é glorificar-se pela criação, e o decreto se aplica aos homens considerando-os como pecadores.  
Sobre esta controvérsia uma observação e duas perguntas podem ser muito importantes:
Observação- Foi o Supralapsarismo a causa principal da revolta e da rebelião de Armínio, um ex aluno de Teodoro de Beza.
Perguntas:
B- Qual seria a posição que Calvino assumiria neste debate? 
C - Que tipo de calvinista, seria Calvino no século XXI?
 Fabio S Faria em 15 de abril de 2014.

FONTE:
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quinta-feira, 10 de abril de 2014

CHAMADOS PARA FORA


Escrito por  Valdemar Figueredo - Professor e teólogo.

A Igreja precisa passar por uma auditoria para se reencontrar e assim retomar a sua caminhada.
O doutor em teologia e escritor Robert C. Linthicum, especialista em missões urbanas, tem uma abordagem muito específica sobre o comportamento da Igreja frente à sua missão. Em seus estudos, ele descreve o que seriam igrejas urbanas eficazes e avalia quais seriam as marcas dessas experiências em diversas cidades do mundo. Neste contexto é que ele defende a tese de que comunidades cristãs eficazes na cidade compreenderam que “a igreja que quiser salvar a sua vida perdê-la-á; mas a igreja que perde sua vida por Cristo e por amor do Evangelho, salvá-la-á.” Fica caracterizado como força deste argumento que a igreja deve viver para o mundo, e não para si. Viver para si seria esperar que tudo e todos convergissem para os seus espaços e programas. Mas o proposto é o convite a que a igreja reconheça que seu campo de atuação não se restringe aos seus espaços nem aos seus programas. Noutros termos, igreja seria sinônimo de “chamados para fora”.
Em termos práticos, a proposta é para que todas as estruturas eclesiásticas sejam sujeitas à missão. O fatal é quando submetemos a missão às estruturas e confundimos igreja com o nosso quintal. Mas, quando temos a missão como norteadora dos nossos atos, tratamos as estruturas eclesiásticas sem tanta parcimônia. Acontece que a Igreja é uma idéia divina, mas ao mesmo tempo uma realização humana. Como idéia divina, ela tem origem e destino eternos. Deus a idealizou assim – e, como escolheu Abraão para abençoar a todas as famílias da terra, projetou a Igreja para abençoar o mundo. E o fez em termos de princípios e propósitos – nos quais ela é uma e sempre será a mesma –, e jamais como uma estrutura pronta e acabada.
A igreja se comunica com o mundo à sua volta sempre em perspectiva cultural, embora sua essência seja divina. E as estruturas eclesiásticas serão tantas quantas forem as experiências de cada grupo e a necessidade de se alcançar cidades e sociedades. O problema é quando, por apego às suas instituições, as igrejas deixam de ser Igreja de Cristo para se transformarem em meras estruturas compactas. É por isso que as igrejas que querem viver para si acabam por perder-se, enquanto que as congregações que vivem para o mundo se salvam. Necessariamente, a vida da igreja é encontrada no cumprimento da missão de doar-se para o mundo. Ou seja, cabe à igreja seguir os passos de Jesus.
As estruturas religiosas rigidamente erguidas não puderam tolerar a presença de Jesus, que propunha o serviço àqueles para quem a porta do templo não se abria. Aí se incluíam os abandonados, as prostitutas, os gentios, os publicanos e pecadores de todo tipo.
 Entre ficar dentro dos templos, protegido pelos guardiões do sagrado, e sair para servir à humanidade, o que o Filho de Deus preferiu?  Daí, sua afirmação categórica: “Quem quiser salvar a sua vida, perdê-la-á; mas quem perder a sua vida por amor de mim, esse a salvará.”
É impressionante o número de pastores que hoje vivem para carregar as estruturas eclesiásticas, sem tempo e sem forças para pastorear as pessoas – da mesma forma que a quantidade de crentes que afluem dominicalmente para os templos por um simples sentido de dever ou por um hábito enraizado. É também impressionante, como empresários conseguem reduzir as igrejas evangélicas a um nicho de mercado, transformando até as lágrimas e os suspiros do povo em produtos. E o que dizer da arrogância das chamadas confissões históricas, que justificam o seu distanciamento do mundo real com a desculpa pálida de que não são deste mundo, preferindo um amálgama da cultura eclesiástica à fluidez da cultura popular brasileira?
Seria ótimo se o ato de ir à igreja representasse a promoção de encontros em que a vida real  não fosse deixada do lado de fora daquelas quatro paredes. Então, as pessoas que para lá acorressem iriam em busca de um lugar de vida, de encontros humanos; um lugar de pulsação e criação, em que o derramamento do Espírito Santo permite que cada um ouça o Evangelho em sua própria língua e saia a anunciar o Reino de Deus ao mundo. A Igreja Evangélica em solo brasileiro precisa passar por uma auditoria para se reencontrar e assim retomar a sua caminhada. Caso contrário, será apenas uma pretensa guardiã dos mistérios divinos, como um antiquário espiritual, enquanto Cristo estará do lado de fora, à sua porta, batendo. Não, a igreja não é guardiã do sagrado; ela é a comunidade da partilha.
Publicado pela revista CRISTIANISMO HOJE - edição de abril/maio de 2010.
http://cristianismohoje.com.br/colunas/valdemar-figueredo



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