MIL E SEISCENTOS ANOS DE DISCUSSÃO!
Nestes últimos anos a controvérsia teológica entre Calvinistas e
Arminianos se acirrou de uma maneira tão deprimente, que existem momentos onde
o sentimento demonstrado dá a impressão de estarmos assistindo ao conflito
entre as famílias Hartfield's e Mac Coys, tal é o nível das ofensas, e dos
ataques desferidos. Este embate acontece principalmente entre os
"neos" de ambas as partes, e pelas declarações, a impressão captada é
que a maioria não conhece devidamente os porquês, assim como a historia real
dos fatos, a origem da doutrina da predestinação, e os primeiros embates.
O foco deste artigo, e dos outros que serão publicados posteriormente, - sob o título de MIL ANOS ANTES DE CALVINO - é lembrar aos "arminianos", que Calvino não tem nada a ver com esta briga, não merecendo, portanto ser o alvo da vossa poderosa artilharia, e lembrar aos "calvinistas" que não pertence a Calvino a patente da criação da doutrina, não havendo, portanto motivo para a jactância que lhes tem sido peculiar.
O foco deste artigo, e dos outros que serão publicados posteriormente, - sob o título de MIL ANOS ANTES DE CALVINO - é lembrar aos "arminianos", que Calvino não tem nada a ver com esta briga, não merecendo, portanto ser o alvo da vossa poderosa artilharia, e lembrar aos "calvinistas" que não pertence a Calvino a patente da criação da doutrina, não havendo, portanto motivo para a jactância que lhes tem sido peculiar.
A PREDESTINAÇÃO DOS SANTOS
Tanto "A
Predestinação dos Santos", como "O Dom da Perseverança" pertencem
ao rol dos últimos escritos de Agostinho. Os dois tratados foram redigidos após
429, ano em que escreveu as "Retratações".
Em Predestinação dos Santos, Agostinho defende a verdade da
predestinação e da graça contra os semipelagianos, pois, estes sustentavam que
o princípio da fé se deve ao próprio crente, e os outros dons eram
consequências deste mérito precedente. Agostinho tenta desconstruir o discurso
semipelagiano demonstrando que os dons posteriores são dados gratuitamente por
Deus, assim como também o início da Fé. Até o ano 397, Agostinho não entendia
como necessário uma graça interior no apelo à salvação, porém ele confessou que
corrigiu esta concepção, sobretudo, a partir do testemunho de Paulo: "Que
tendes que não tenhais recebido?".
Naquela época, a maior parte dos padres teólogos se inclinava a
ligar o batismo com a perseverança final, de modo que todos os cristãos
possuíam a certeza da salvação. A exceção eram os heréticos, os dissidentes e
os apóstatas. Devido a este entendimento, Agostinho em suas homílias e em
vários tratados apresenta a ideia de que um cristão possa não alcançar a
salvação. Desta forma, ele uniu o problema da predestinação ao da
perseverança final. Em consequência do pecado original, a humanidade foi
consignada à condenação, mas Deus, desta massa de perdição salva aqueles que
Ele destinou à salvação, e estes serão salvos infalivelmente. A quantidade dos
eleitos foi fixada desde a eternidade, com Deus rejeitando positivamente os
outros. Ele permite que, em vista dos pecados estas pessoas rejeitadas se
entreguem livremente à danação.
Ao rever sua posição anterior - quando pensava como os semipelagianos
- Agostinho passa a atribuir à onipotência da graça divina a exclusiva e
primeira iniciativa da salvação. Por este juízo, o homem não está em condições
de querer nada, a menos que Deus assista nele este querer: o ser bom, ou o ser mau! Fé
e incredulidade, o bem estar extremo e condenação são remetidos à vontade
divina de tal modo que, por motivo da não condição de indecifrabilidade da
eleição divina por graça, são salvos somente os eleitos tirados da massa da
perdição, enquanto outros homens por causa da permissividade de Deus perdem-se
eternamente. Eles não são objetos de injustiça de Deus, porque nenhum homem após
o pecado tem direito à salvação.
Através destas afirmações, Agostinho ensina uma vontade de Deus
salvífica limitada, e diz que se deve ter por firme que Deus é absolutamente
justo, mesmo que não se possa ter uma explicação possível desta justiça. Após o
ano de 421, Agostinho ensinou que Deus destinou à salvação apenas aqueles que
efetivamente alcançam a salvação, enquanto os outros são predestinados ao
eterno aniquilamento.
É importante saber que Agostinho jamais mencionou a doutrina
segundo a qual "Deus quer que todos os homens se salvem". [1 Tm 2,4.]
CONSEQUENCIAS DA DOUTRINA DE AGOSTINHO NA HISTÓRIA DA IGREJA:
Desde o início a doutrina agostiniana enfrentou oposição já que
era contrária ao pensamento dominante da salvação universal. Embora, a doutrina
da predestinação houvesse sido aceita pela igreja ocidental, rapidamente se
tornou uma fonte de desentendimentos.
No século IX o monge Godescalco (Gottzchalk) do mosteiro de Fulga
suscitou uma nova controvérsia, e nesta foram envolvidos os sínodos de Mongúncia em 848 e
de Quiercy em 849. Os dois sínodos condenaram a doutrina proposta por
Godescalco, que defendia uma dupla predestinação: tanto a salvação quanto
condenação são determinadas para cada pessoa desde o nascimento, não havendo
por parte de Deus qualquer vontade de salvação universal.
<<<< para muitos a doutrina de Godescalco foi a
inspiração para o supralapsarismo de Teodoro de Beza >>>.
No ano de 860 o sínodo de Toucy na Lorena tentou encerar o debate
sobre a predestinação afirmando que se devia ensinar que há uma vontade de
salvação universal em Deus, e uma redenção que atinge todos os homens.
No período após o concílio de Trento duas escolas teológicas
tiveram um embate sobre a predestinação. Enquanto a escola molinista realçava a
liberdade do homem considerando que a predestinação dos adultos à vida eterna
seguia a previsão dos méritos, a escola de Bañez destacava a gratuidade absoluta
da predestinação, à glória e a eficácia intrínseca da graça.
No século XVI o foco recaiu sobre os reformadores Lutero e
Calvino. Os dois seguindo Agostinho afirmaram e defenderam a posição de que uns
são eleitos, e, outros rejeitados desde a eternidade.
Neste mesmo período no lado católico surgiu na Bélgica, Cornélio
Jansens, professor de teologia em Lovaina, e mais tarde bispo em Ypres. Ele não
concordava que a doutrina de muitos escolásticos de renome estivesse tão
afastada daquela de Agostinho sobre pontos capitais como a graça e o livre
arbítrio. Por isso tentou desenvolver a fundo as idéias de Agostinho escrevendo
até a véspera de sua morte a obra AUGUSTINUS.
Os principais pontos defendidos são:
1- a natureza humana
depois do pecado original ficou inteiramente despojada da graça tornando
impossível ao homem observar todos os mandamentos divinos.
2- O pecado original tirou a
liberdade de querer, e tornou o homem incapaz de qualquer bem, inclinando-o
necessariamente ao mal.
3-Cristo ofereceu aos homens
a graça da salvação, mas não morreu por todos, e sim para uns poucos
eleitos.
4-A predestinação é, pois,
gratuita, e precede a qualquer ato de nossa vontade.
5- O verdadeiro bem deriva,
portanto da graça eficaz que Deus concede aos predestinados.
6- A graça de Deus é
irresistível, mesmo à natureza humana totalmente corrompida.
Estas proposições ou afirmações negavam a vontade salvífica,
operante e universal de Deus, e por esta causa foram condenadas em 1653 pelo
papa Inocêncio X.
Conclusão:
Se analisarmos sem paixões, sem venerações, a historia da teologia
cristã nos últimos 1600 anos, não será difícil concluir que a doutrina da
predestinação sempre esteve presente no cardápio principal, e que sempre houve controvérsias.
Uns acrescentaram, outros suprimiram alguns pontos, mas o esqueleto é o mesmo
formulado pelo bispo de Hipona no final do século IV, e início do século V.
Diante destes fatos também se pode afirmar que ninguém precisa ser
“calvinista” para aceitar a predestinação, ou ser “arminiano” para não
aceitá-la.
Em meu parco e reles entendimento creio que Deus em sua soberania salva,
justifica e glorifica os que elegeu, independente de serem devotos de Calvino
ou de Armínio.
“Quando existem ciumeiras e brigas entre vocês, será que isso não prova
que vocês são pessoas deste mundo e fazem o que todos fazem? Quando alguém diz:
EU SOU DE..., e outro: EU SOU..., será que assim não estão agindo como pessoas
deste mundo?”
Bibliografia:
- Teologia Sistemática Histórica e Filosófica de Alister McGrath
- A GRAÇA (II) << A predestinação dos santos: Santo Agostinho
>> - Coleção Patrística
Uma verdade que todos precisam saber, pois imaginam que Calvino era responsável por levantar esse questionamento, e vamos embora sendo sal mano!
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