Eleição é para todos. No entanto, interpretar a doutrina controversa deixa claro que a salvação não é uma conquista humana.
Por Roger Olson dia 05/02/13. Em Christianity Today.
Quando eu era criança, meu irmão e eu, ás vezes passávamos parte do sábado entregando folhetos evangélicos no nosso bairro. Nós éramos filhos de pastor e provavelmente sentíamos alguma obrigação de fazê-lo (já que era algo promovido pela escola dominical e pelo grupo de jovens), mas eu posso honestamente dizer que também sentíamos que era nossa contribuição para o reino de Deus.
Um dos nossos folhetos favoritos ilustrava
uma cédula de votação. O grande pregador Herschel Hobbs, conhecido entre os
Batistas do Sul como "Sr Batista", pregou um sermão famoso que foi
publicado no informativo A Hora Batista, em outubro de 1967. O título do
sermão era "Dia da Eleição de Deus", cujo ponto principal foi: O
diabo e Deus realizaram uma eleição para determinar se ou não você seria salvo
ou perdido. O diabo votou contra você E Deus votou em você. Então, como a
eleição foi um empate cabe a você dar o voto decisivo.
Sem dúvida que o conceito da doutrina da
eleição tornou-se popular entre os cristãos. Afinal de contas, nós os
americanos prezamos nosso direito e liberdade de votar. Mas é isso que a Bíblia
quer dizer com eleição? Será que o evangelho diz que os votos de Deus são para
a nossa salvação, os votos contra são de Satanás, e nós individualmente,
livremente damos o voto que decide o nosso destino eterno?
Provavelmente não. Alguns estudiosos da
Bíblia e teólogos diriam: definitivamente não. Parece banalizar o conceito de
eleição e especialmente, a soberania de Deus em nossa salvação. Por outro lado,
pode haver alguma verdade nesta forma de conceber o problema, mesmo que não
fazendo justiça à profundidade da doutrina bíblica da eleição.
Infelizmente, a "doutrina da
eleição" tem vindo a ser associada especialmente, e mesmo exclusivamente
a um ramo particular da teologia cristã - um povo conhecido como
reformados.- Esse povo descende da reforma Suíça do século 16 e, mais
notadamente a partir do francês reformador João Calvino, que viveu e
espiritualmente conduziu os suíços da cidade de Genebra. Muitas
vezes, "eleição" é identificada como a doutrina distintiva do
calvinismo, como se outro ramo do cristianismo não acreditasse nela.
Na verdade, seria impossível ser um cristão
que crê na Bíblia sem afirmar a graça seletiva de Deus e ter uma doutrina da
eleição. O mesmo poderia ser dito sobre a predestinação, muitas vezes vista
como um sinônimo para a eleição. A Bíblia está cheia de referências de ambas, a
escolha de pessoas por Deus, de indivíduos e grupos. Abraão não foi
apenas um "chamado" por Deus, mas também "escolhido" ou
"eleito" para ser o pai do "povo eleito", a nação dos
"eleitos" _ Israel (Gn 12:1-3; Is 45:4) A igreja é um
"eleito" de Deus, escolhido para a adoção como seus filhos por meio
de Jesus Cristo (Ef 1-5). Paulo foi claramente escolhido por Deus para o
apostolado (Atos 9).
Não seria nenhuma inverdade que a eleição de
pessoas por Deus é fundamental para a mensagem bíblica e para o evangelho.
Pode-se dizer com segurança que a eleição do povo é a graça de Deus, e não é
uma realização humana. Em nenhum lugar da Bíblia se pode insinuar que as
pessoas elegem a si mesmas.
A TEOLOGIA DE TOCADOS POR UM ANJO
Isso nos traz de volta para o "folheto evangélico e o sermão de Hobbs." Todos os cristãos, e não apenas os calvinistas devem rejeitar a mensagem subjacente de que a eleição é um ato humano, conquista ou realização. Os teólogos têm um nome para essa crença: Semi Pelagianismo. É sem dúvida discutível o modo de exibição padrão de salvação e serviço entre os cristãos americanos, especialmente os cristãos mais jovens, mas todos os ramos do cristianismo têm condenado isso como heresia, porque contradiz completamente as Escrituras.
Semi pelagianismo é a idéia de que
os seres humanos tomam a iniciativa de sua salvação e serviço a Deus.
Nós decidimos se queremos ser salvos ou se
queremos entrar no serviço de Deus, completamente por nós mesmos, sem a
necessidade da graça antecedente ou preveniente.
A Graça Preveniente é a graça que convence os
condenados, chama, ilumina e capacita. Os teólogos cristãos discordam sobre se
é resistível ou irresistível, mas todos os teólogos evangélicos concordam que é
necessária para o primeiro exercício de uma boa vontade para com Deus.
Alguns anos atrás, uma série de televisão,
popular, mostrou anjos em disfarçados de humanos ajudando as pessoas em perigo
a se voltar para Deus. Em um episódio, um anjo lindo e jovem, com sotaque
escocês aconselhou um homem a "chegar-se a Deus, tanto quanto pudesse, e
então Ele iria estender a mão e o levaria pelo resto do caminho". É
isso que chamo de "Teologia de tocados por um anjo". Por si só,
sem o esclarecimento bíblico e explicação teológica ela expressa o
semi-pelagianismo.
Ao contrário do que muitos pensam as
tradições do cristianismo protestante, tanto calvinistas quanto arminianistas,
sempre enfatizaram a iniciativa de Deus na salvação e no serviço. (
Arminianismo é a tradição teológica instituída após Jacob Arminius,
teólogo holandês do século 17 que afirmou o livre arbítrio humano). Isto é, se
qualquer pessoa ou grupo encontra a reconciliação com Deus e / ou um papel na
missão de Deus, isso é devido ao próprio Deus; eleição da graça, e não decisão
humana ou realização sozinha.
Infelizmente, a doutrina da eleição se
tornou um campo de batalha entre os protestantes evangélicos.
Três pontos de vista principais disputam a
atenção e crença, e todos os três apelam para as Escrituras.
Todos os três afirmam que os outros dois não
alcançam a comprovação e aprovação bíblica e teológica. Ocasionalmente
defensores das três teses caem em debate verbal desagradável com o outro. Os
defensores das três teses necessitam perceber que eles têm muito em comum,
especialmente a crença na iniciativa divina, que Deus é quem elege aquele cuja
graça é necessária para cada coisa boa essa pessoa faz, incluindo o primeiro
movimento da vontade em direção a Deus.
AS TRÊS VISÕES
A primeira visão é o calvinismo clássico e
tradicional. Não foi criada por Calvino, mas veio a ser associada com seu nome
em terras inglesas através principalmente dos puritanos.
No início, reformadores como Martinho Lutero
e Ulrich Zwinglio tinham a mesma crença sobre a eleição.
De acordo com Calvino, a eleição, que é o
mesmo que predestinação e pré-ordenação referem-se ao "decreto eterno de
Deus, pelo qual ELE próprio predeterminou o que ELE quis que cada
homem se tornasse... [E] a vida eterna é preordenada para alguns e danação
eterna para os outros (Institutas da Religião Cristã III. XXI. 5).
Muitas pessoas se referem a isso como
"dupla predestinação". Calvino para afirmar isto usou como base
Romanos 9, e outras passagens que enfatizam a soberania de Deus em tudo,
incluindo o destino eterno de cada indivíduo.
A segunda visão é o Arminianismo, clássico e
tradicional. É nomeado após o teólogo Arminius, mas as linhas básicas da visão
são anteriores a ele. Talvez o mais influente arminiano tenha sido John Wesley,
fundador da tradição metodista, que também é venerado pelos cristãos na
santidade e tradições pentecostais.
De acordo com o ensaio de Wesley "Em
Predestinação", seguindo fielmente Arminius, eleição (pré-destino)
significa que "Deus previu aqueles em cada nação, quem iria acreditar -
crer - desde o princípio do mundo até a consumação de todas as coisas. Ele
baseou isso em Romanos 8, especialmente os versículos 29 e 30. Como todos os
arminianos (e muitos que não usam este rótulo, mas concordam com sua doutrina
essencial da eleição), Wesley afirmou o livre arbítrio, capacitados pela graça,
porque caso contrário, se o homem não fosse livre, ele não poderia ser
responsável quer por seus pensamentos, palavras ou ações."
MONTANHA
DE VERSOS
A maioria dos cristãos evangélicos contemporâneos apóia uma forma ou outra, a visão de Calvino ou a de Wesley sobre a eleição. Todos concordam que Deus elege pessoas ao serviço, todos concordam que Deus escolhe (através de eleição corporativa) um povo para ser seu. O problema da controvérsia é a eleição para a salvação. É incondicional e irresistível, ou isso depende de uma vontade em aceitá-la?
A divisão é sobre salvação individual, e
especialmente se Deus predestina algumas pessoas para o inferno.
Arminianos acham que é abominável e
prejudicial para a reputação de Deus, com base em passagens como João 3:16,
2Pedro 3: 9 e 1Timóteo 2:4. Os Calvinistas argumentam que permitir que os seres
humanos possam resistir e frustrar a vontade de Deus limita sua Soberania, e
mesmo que não intencionalmente diminui sua divindade. Se os
pecadores podem livremente contribuir para sua própria salvação, então a graça
não é o único fator.
Ambos os lados neste debate podem acumular
montanhas de versículos e argumentos para apoiar sua visão. Parece
duvidoso que igualmente cristãos tementes a Deus, que creem na Bíblia e amam a
Jesus nunca vão chegar a um consenso sobre o assunto. Mas o consenso já existe nisto:
"qualquer que seja o papel desempenhado pelos seres humanos na sua
salvação, a salvação é obra de Deus." Mesmo arminianos, na sua melhor e
mais verdadeira crença acreditam que os pecadores recebem a graça salvadora de
Deus, só que lhes permite receber com a resposta livre da fé.
"TODOS OS EVANGÉLICOS CONCORDAM QUE A SALVAÇÃO É OBRA DE DEUS E NÃO
NOSSA. NOSSAS BOAS OBRAS, ATÉ MESMO AS NOSSAS DECISÕES LIVRES OU SINAIS DE
GRAÇA, SOMAM A NADA QUANDO COMPARADAS COM A GRAÇA E O PODER DE ELEIÇÃO DE
DEUS"
Uma terceira visão contemporânea aparece
entre os cristãos evangélicos. Se ela se inclina para mais perto do calvinista
clássico ou da doutrina arminiana de eleição é muito debatido. O chamado
"calvinismo evangélico" é defendido pelos seguidores dos teólogos
escoceses Thomas Torrance e James Torrance. Eles, por sua vez, foram
influenciados pelo teólogo suíço Karl Barth e, antes de Barth, pelos teólogos
escoceses John MacLeod Campbell e Forsyth PT.
Este ponto de vista foi recentemente
explicado e defendido por 12 dos principais teólogos do "calvinismo
evangélico": “ENSAIOS SOBRE RECURSOS PARA A REFORMA CONTINUADA DA
IGREJA."
De acordo com o "calvinismo
evangélico" (TERMO ERRÔNEO já que todos os calvinistas se consideram
evangélicos de alguma maneira), Cristo deve ser o centro da eleição tanto como
seu objeto e seu sujeito. Deus elege Jesus Cristo para ser O Salvador, e então
elege as pessoas apenas "nele". Em Jesus e sua cruz, Deus disse SIM a
todas as pessoas, não havendo o correspondente divino, NÃO! Se alguém
tiver sido eleito para a salvação é porque Deus primeiramente elegeu Jesus
Cristo e, em seguida pela graça incluiu os pecadores nesta eleição. Se alguém
rejeita sua inclusão na eleição de Cristo é unicamente por causa de sua
rejeição inexplicável da graça de Deus estendida a eles em Jesus Cristo.
Os editores do Calvinismo Evangélico afirmam
que "todos estão incluídos na obra salvífica de Cristo, e... a salvação é
pela graça e somente por Cristo".
A eleição para a salvação é uma boa notícia,
porque não depende da livre vontade frágil e vacilante dos pecadores, e ninguém
é excluído, exceto aqueles que voluntariamente se excluem.
Os Calvinistas e Arminianos clássicos
concordam com muito do "calvinismo evangélico", mas ambos o acham
inconsistente em alguns pontos cruciais. Sua principal queixa em comum é que
ele cai em contradição. Como, perguntam eles, pode-se afirmar a universalidade
da graça eletiva e negar o livre arbítrio em relação ao ser eleito, ao mesmo
tempo afirmar o livre arbítrio para rejeitar a verdade da eleição?
Os calvinistas evangélicos, por outro lado encontra
nos dois pontos de vista alternativos da eleição, uma problemática: "é que
cada um à sua maneira parece refutar a bondade do caráter de Deus."
Livros evangélicos sobre a doutrina da
eleição são abundantes. Infelizmente, a maioria deles são polêmicos, e gastam
mais tempo discutindo contra uma ou outra visão do que ressaltando e explicando
o terreno comum.
Especialmente nas últimas duas a três décadas
a doutrina da eleição tornou-se uma causa de divisão mais do que de unidade
entre os evangélicos. Mais atenção deve ser dada às áreas de acordo amplo e
profundo, e menos para áreas de diversidade. Os cristãos evangélicos na melhor
das hipóteses dividem uma doutrina comum da eleição. O diabo está nos detalhes,
especialmente quando eles se tornam pontos de acusações de heresia ou
infidelidade bíblica.
Todos os evangélicos concordam que a salvação
que a salvação é obra de Deus e não nossa. Nossas boas obras, até mesmo as
nossas decisões livres ou sinais de graça, resultam a nada quando comparadas
com a graça e o poder de Deus na eleição. Elas são como os pilares enganosos
que o arquiteto inglês Christopher Wren instalou para tranquilizar os
dirigentes da cidade de Windsor que duvidavam do seu esquema para apoiar o
segundo andar do salão da prefeitura. Wren tinha de fato deixado espaço entre
os pilares do topo e do teto do primeiro andar, mas o espaço era bem minúsculo,
quase invisível, e o ardil não foi descoberto senão anos depois quando
operários construíram andaimes para limpar o teto. Os pilares que pareciam tão
importantes para o projeto arquitetônico, simplesmente foram revelados (como as
nossas impressionantes boas obras exteriores) sem sentido.
DEUS
IRÁ ENCONTRAR UM CAMINHO
Se um pecador vem a Cristo e recebe a
salvação, todos os evangélicos concordam que é devido à graça da eleição de
Deus e não por qualquer obra meritória. Eles também concordam que Deus é
soberano na salvação; a eleição é uma forma bíblica de expressar essa
soberania.
O texto de Efésios 1 exalta a soberania de
Deus na eleição do seu povo. Lá Efésios 1) e em outros lugares, todavia, é
possível interpretar a eleição corporativamente. Todos os evangélicos concordam
que a eleição de um povo, de Israel e da Igreja por Deus é incondicional. Deus
escolhe ter um povo para o seu nome e para sua glória. Ele opta por ter um povo
no qual possa derramar o seu amor generoso. Ele opta por ter um povo para ser
uma luz para as nações e um testemunho da sua grandeza e bondade para os seres
espirituais que povoam o mundo invisível.
Os evangélicos debatem e também não chegam a
um acordo se a inclusão dos indivíduos no povo eleito de Deus envolve qualquer
nível de vontade livre, porém todos concordam que a existência do povo de Deus
não é dependente da escolha humana. “Como uma famosa afirmativa do
filme Jurassic Park que diz: “a vida encontra uma maneira”, a fé
evangélica, de todos os tipos e tribos concorda que “Deus irá harmonizar um
caminho” para ter um povo para colocar o seu nome.
Os calvinistas, arminianos e calvinistas
evangélicos tendem a achar que a posição do outro é inconsistente, mas a
inconsistência não é heresia. Os evangélicos divididos sobre os detalhes da
doutrina da eleição talvez pudessem e devessem se reunir em torno de uma
oração. O grande pregador batista, o inglês Charles Spurgeon, convertido em uma
igreja metodista, mas um calvinista apaixonado, frequentemente fazia uma oração
aparentemente inconsistente, nas reuniões de sua igreja. No momento da oração
noturna dizia: "Deus chame os seus eleitos, e em seguida eleja outros
mais". Os evangélicos de diferentes opiniões podem se assustar com a
aparente contradição, mas todos podiam alegrar-se com o espírito da generosidade
e esperança que invadia e irradiava do apelo de Spurgeon.
ROGER OLSON é professor de teologia na
Universidade de Baylor de W. Truett George Theological Seminary.
http://www.christianitytoday.com/ct/2013/january-february/election-is-for-everyone.html
5 comentários: