sexta-feira, 30 de março de 2018

A INCRÍVEL HOSPITALIDADE DA SEXTA-FEIRA SANTA

            

         A INCRÍVEL HOSPITALIDADE DA SEXTA-FEIRA SANTA

 A morte de Jesus demonstra o amor de Deus por estranhos, inimigos e estranhos”.
KRISH KANDIAH em 29 DE MARÇO DE 2018.

[TARDIS (acrônimo de Time and Relative Dimension(s) in Space) - em português: Tempo e Dimensão Relativas no Espaço - é a nave espacial e máquina do tempo no seriado de ficção científica da BBC Doctor Who. A TARDIS pode levar seus passageiros para qualquer lugar no tempo e espaço. Embora seu exterior pareça com uma cabine de polícia de Londres devido a um defeito irreparável no sistema de camuflagem (na sétima temporada o Doutor afirma que há como reverter, mas ele também afirma que perderia a TARDIS muito facilmente e também afirma que já se acostumou com o jeito de sua TARDIS), seu interior é muito maior do que o exterior (essa é a tecnologia dos Senhores do Tempo), contendo inúmeras salas.]Era estranho, um objeto estranho que aparecia em lugares aleatórios. E apesar de ser tão alienígena - literalmente - ninguém parece duvidar de sua existência e feitos quando assiste ao programa mundial de televisão: Doctor Who .


A cruz de Cristo é uma anomalia semelhante. Na era da moda depois da era da moda, é exibida em igrejas, escolas e cemitérios em todo o mundo, enfeita a letra de nossas canções de adoração e as paredes de nossas galerias de arte - este antigo instrumento de execução romana tornou-se um dos símbolos mais reconhecidos no planeta. E, no entanto, muitas vezes escapa à observação das pessoas.
Como a TARDIS, a cruz é um ponto estranho de partida para algo muito maior do que sua humilde aparência sugeriria. Algo que parecia tão pequeno e insignificante - tal como um judeu relativamente desconhecido morrendo de maneira banal nas mãos do Império Romano – é de fato, um convite para uma realidade muito maior. Isso nos leva à profundidade cavernosa do significado do amor, graça, ira e compaixão de Deus. Oferece aos que duvidam nova fé, nova esperança para os desanimados, para os solitários e para os perdidos. A cruz não é simplesmente uma solenização da morte, mas um convite à vida.
No coração da expiação  está a hospitalidade da misericórdia  divina, onde Deus convida os indignos e excluídos a voltar para casa com ele.
As palavras finais de Jesus na cruz, conforme registradas nos Evangelhos, nos fornecem o ponto de entrada para entender esse misterioso convite. Cada um dos sete ditos nos convida crucialmente a compartilhar da hospitalidade misericordiosa de Deus, não apenas sendo acolhidos como estranhos e inimigos que outrora éramos, mas também acolhendo outros estranhos e inimigos em seu nome e por Ele.
'PAI, PERDOA-LHES, PORQUE ELES NÃO SABEM O QUE FAZEM’.
       Como cristãos, cremos que a crucificação de Jesus marca o momento mais sombrio da história humana, mas, já no início é possível ver o caráter de Cristo brilhar. O evangelho de Lucas registra as primeiras palavras de Jesus na cruz: “Pai, perdoa-lhes, porque não sabem o que fazem” (23:34). Jesus está pedindo a graça de Deus tanto para os judeus que estão voluntariamente rejeitando a ele quanto para os romanos que o estão executando brutalmente. Tanto para os soldados que estão martelando os cravos em seus pulsos, quanto para as multidões que assistem em sinal de aprovação.
Suas palavras também tem uma ressonância maior, indo muito além daqueles carrascos do primeiro século, até seus cúmplices no pecado de todos os séculos. As palavras de Jesus não são uma oração para si, mas para os outros. Ele não usa a sua última energia para pedir ajuda pessoal de seu Pai celestial, mas para defender a ação de homens que são estranhos e inimigos para ele. Suas palavras misericordiosas são um ato preventivo de graça antes do ato sórdido que está por vir. É um precedente de graça que abre um rastro para todos os que procuram seguir seus passos. É uma atitude que nos desafia a colocar as necessidades dos outros - até mesmo de inimigos e estranhos - à frente das nossas.
TENHO SEDE’
    A generosa oração de misericórdia de Jesus por seus inimigos contrasta com o que é reconhecido como sua segunda palavra dita na cruz. Com as palavras "tenho sede", Ele agora pede misericórdia na forma de uma bebida para lhe dar alívio. Isso parece intrigante vindo de alguém que se revelou como a “água da vida” a uma mulher estranha em um poço samaritano. O homem que ensinou seus discípulos a saciar a sede de estranhos como prova de seu amor por Deus, agora se torna aquele estranho sedento. É irônico que aquele que uma vez forneceu vinho em uma festa de casamento agora não tenha nada para beber. Ou talvez não seja irônico, mas pungente, que aquele que poderia acalmar as tempestades e andar sobre a água agora restringisse seu próprio poder e confiasse em outros para lhe trazer uma bebida.
Em sua aflição, a Jesus é oferecido vinagre de vinho em uma esponja. Ele recebe, permitindo e aceitando como um ato de hospitalidade, mesmo neste momento mais sombrio. Ele a recebe, apesar de ser pouco mais que um gesto de desprezo e hostilidade. Será que nós quando estamos em necessidade, podemos ser como Jesus e ver este momento como uma oportunidade de dar aos outros a bênção do ministério de hospitalidade?
EM VERDADE VOS DIGO QUE HOJE ESTARÁS COMIGO NO PARAÍSO.
    Na troca de palavras entre Jesus e o criminoso crucificado ao lado dele, nos é dada uma imagem significativa das boas-vindas que Deus oferece em meio a todo o trauma e tragédia. Naquele momento falar era algo extremamente difícil por causa da forma macabra da crucificação. Jesus escolhe usar algumas de suas últimas condições respiratórias para falar palavras de conforto e compaixão a um estranho. Novamente vemos na cruz de Cristo a história da incrível e maravilhosa graça. No coração da expiação está a hospitalidade divina, onde Deus convida os indignos e excluídos a voltar para casa com ele.
O ladrão na cruz reconhece a solidariedade de Jesus - ele sabe que Jesus enfrenta o mesmo sofrimento que ele. Ele também reconhece a santidade de Jesus: enquanto todos os outros viam um pretenso rei, um “não salvador impotente”, um quase “messias desapontador”, esse criminoso sozinho reconhece não só a sua própria culpa, mas também a inocência de Jesus frente a todas as acusações.
O criminoso reconhece a soberania de Jesus – reconhece que havia um reino esperando por Jesus após sua morte. Pilatos não entendera isso, apesar da legenda que ele anexou à cruz. Os líderes religiosos não haviam compreendido isso, apesar de inúmeras declarações proféticas que apontavam exatamente para esse momento. Nem mesmo os discípulos de Jesus haviam compreendido, apesar de terem passado três anos ouvindo Jesus explicar-lhes.
Além do próprio Jesus, nenhuma outra pessoa havia entendido que a crucificação não era apenas um erro terrível de justiça, mas era o meio pelo qual Ele seria coroado rei. Jesus endossa a opinião do próximo sobre os acontecimentos, respondendo graciosamente com a certeza que se tornou preciosa como a terceira das sete palavras de Jesus na cruz: “Em verdade te digo que hoje estarás comigo no paraíso” (Lucas 23:43). .
Jesus quer que esse criminoso confesso não tenha dúvidas de que em breve estará recebendo a última recepção, uma recepção VIP na vida eterna na presença de Deus. Em meio à dor extrema que sentia, essas eram palavras de conforto e privilégio são palavras para se agarrar. Caso nos percamos no tratamento preferencial dedicado por Jesus aos excluídos em seu ministério, Ele se certifica de que não perderemos isso aqui. Mirando para a sua coroação como Rei do Céu, Jesus traz um criminoso condenado como mais um de seu Reino.
'AQUI ESTÁ O SEU FILHO. . . . AQUI ESTÁ SUA MÃE.
      O quarto dito por Jesus na cruz está registrado no evangelho de João. Jesus se volta para sua mãe Maria, ao lado de seu amigo João, e diz: “Mulher, aí está seu filho”, e para João, ele diz: “Aí está sua mãe”. Mesmo morrer pelos pecados do mundo e assegurar nosso lar eterno não eram uma tarefa grande o suficiente.  Jesus também assegura a hospitalidade temporal para aqueles mais próximos a Ele. O altamente respeitado erudito do Novo Testamento, D. A. Carson, reconhece nessas palavras o eco de uma fórmula de adoção legal, e é o próprio João a dizer que “daquele momento em diante, esse discípulo a levou para sua casa”.
João adotou Maria como sua própria mãe, para cuidar de suas necessidades e consolá-la neste momento de grande perda pessoal. Neste simples ato, vemos Jesus na prática promover a hospitalidade fazendo com que as pessoas se reconciliem com Deus e umas com as outras.
'MEU DEUS, MEU DEUS, POR QUE ME ABANDONASTE?'
     Tanto Mateus como Marcos registra o quinto dito de Jesus na cruz em um grito de desolação: “Meu Deus, meu Deus, por que me abandonaste?” Aqui Jesus está citando o Salmo 22, onde o Rei Davi está enfrentando sérios problemas. O grito de desespero de Davi, a descrição do ridículo e dos insultos recebidos, o coração derretendo como cera, a sede e a aposta para ver com quem ficará suas roupas parecem descrever a crucificação de Jesus com uma exatidão incrível. Mas o uso feito por Jesus destas palavras expressa um desespero muito maior pelo isolamento experimentado por Ele naquele momento; o Deus Filho, estava alienado de Deus, seu próprio Pai.
De algum modo profundo e misterioso, o relacionamento da divindade, o único Deus que está em três pessoas, foi interrompido pela cruz. A consequência de Jesus carregar o peso esmagador dos pecados do mundo em seus ombros é que o faz se alienar de seu pai. De alguma forma, Jesus teve que ser abandonado pelo pai, para que pudéssemos ser perdoados. Ele foi rejeitado para que pudéssemos ser aceitos. Ele foi excluído da misericórdia de Deus para que pudéssemos ser incluídos. Aqui está o ato final de hospitalidade: “Jesus seria deslocado da presença de Deus para que pudéssemos ser acolhidos”.
'PAI, EM TUAS MÃOS ENTREGO O MEU ESPÍRITO'.
      As palavras finais de Jesus quando o sol escureceu ao meio-dia e o véu do templo se dividiu em dois, está registrada no evangelho de Lucas; declaram que Deus não é mais um estranho para o seu povo - todos são bem-vindos em sua presença, seu santuário. Jesus clama: “Pai, nas tuas mãos entrego o meu espírito”. Estas palavras demonstram que, apesar da agonia da sua morte, Jesus ainda tem grande confiança e afeição pelo Pai celestial.
As palavras nos lábios de Jesus são emprestadas do Salmo 31, que é efetivamente um pedido de asilo. No meio de grande aflição pessoal, o grito de Davi expressa sua confiança no cuidado protetor de Deus, no qual ele busca refúgio. Apesar de todas as aparências, Deus é seu lugar seguro, seu quarto do pânico, sua fortaleza. Jesus agora pede a mesma hospitalidade de Deus - para o santuário da turbulência em que se encontra. É um momento comovente, testemunhado por uma pessoa inesperada: um centurião romano, um estranho em meio a uma multidão de pessoas de judeus. Ele declara seu louvor a Deus: "Certamente ele era o Filho de Deus!" Este inimigo e estranho vê o que ninguém pode ver. Mais uma vez, mesmo no próprio momento de sua morte, Jesus está abrindo o caminho para que aqueles previamente excluídos do reino de Deus sejam reconciliados e acolhidos.
'ESTÁ CONSUMADO. '
   Finalmente Jesus profere suas últimas palavras: 'Está consumado'. Existem tantas maneiras diferentes para se mostrar a veracidade  dessas palavras. O sofrimento de Jesus findou - Ele se identificou com a dor da humanidade ao extremo. O sistema sacrifical que sustentou a prática religiosa judaica por tanto tempo terminou e terminou porque a ira de Deus está totalmente satisfeita com o sacrifício de seu único Filho. O cativeiro da humanidade ao pecado terminou, o pagamento do resgate necessário para nos libertar desta escravidão foi pago. A Páscoa terminou quando Jesus, o Cordeiro de Deus que tira os pecados do mundo, cumpriu tudo o que o resgate de Deus de seu povo do Egito simbolizou. A batalha contra o mal terminou quando Jesus, o conquistador, vence a morte morrendo em nosso lugar. Nossa exclusão da presença da ira de Deus finalmente acabou.
As sete frases ditas na cruz, naquela estranha, tenebrosa, mas boa Sexta Feira pintam uma bela imagem multifacetada de Jesus como o grande anfitrião do céu.
As sete frases também nos apresenta um desafio urgente nesta Páscoa: “estamos dispostos a nos unir a Jesus e convidar outros - forasteiros, inimigos e estranhos - para nosso lar e nosso coração em antecipação à nossa esperança eterna”?
Para ser honesto, eu não tinha notado antes que a hospitalidade é o fio de ouro que tece ao longo de cada um dos ditos da cruz. Apesar de ensinar essas passagens a cada Sexta-feira Santa por décadas, foi necessária uma crise global de refugiados para abrir meus olhos para o fato de que receber o estranho é um tema dominante, não apenas da crucificação, mas de toda a Escritura. Muitas vezes eu tinha interpretado esses versículos como uma forma de terapia pietista - eu apenas lembrava a minha congregação o quanto Deus os amava, tanto é que Jesus morreu por eles. Isso é verdade, mas a cruz tem muito mais a dizer para nós. Muito mais para nos desafiar.
Ouvindo novamente as palavras de Cristo ditas na cruz, minha oração é que cada um seja desafiado pela hospitalidade radical de Deus e possa considerar o que realmente significa andar no caminho da cruz. Para quem Deus quer que mostremos uma hospitalidade radical? Para quem Deus está pedindo para você abrir sua casa, sua família, sua igreja?   Somente Cristo morreu pelos pecados do mundo, mas sua cruz deve moldar nossas vidas e, certamente, isso significa que devemos anunciar e oferecer a vinda de Cristo ao excluído, ao refugiado, ao filho adotivo e à viúva.
Krish Kandiah é o fundador da instituição de caridade de acolhimento e adoção Home for Good e dá palestras sobre justiça, hospitalidade e missão no Regents Park College, na Universidade de Oxford e no Regent College Vancouver. Este artigo é adaptado de seu livro mais recente, God Is Stranger (IVP, 2017).


Traduzido e formatado por Fabio Silveira de Faria


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